Abandono Escolar em Angola: Obstáculo ao Progresso e ao Desenvolvimento

Sofia, estudante da escola 5039 em Viana
Sexta, 09 de Maio de 2025 - 15:41

O Sonho de Sofia: Superando Barreiras para Permanecer na Escola

Em Angola, frequentar a escola ainda é um desafio para muitas crianças. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, em 2022, o índice de abandono escolar no ensino primário em Angola chegou a 11,6% das crianças que estavam matriculadas desde o início do ano lectivo. A disparidade entre áreas urbanas e rurais agrava-se ainda mais para as meninas, que enfrentam preconceitos de género e a falta de infraestrutura adequada para a sua higiene íntima.

Sofia, uma menina de 12 anos, estudante da Escola Pública nº 5039, conhece bem essas dificuldades, mas ainda assim tem a escola como um local de aprendizagem, um espaço de acolhimento e crescimento. “Apesar da nossa escola não ter tantas condições, como uma boa casa de banho, eu amo ir à escola e costumo aconselhar os meus colegas a não faltarem. Uma criança deve ir à escola para aprender e se tornar alguém na vida. Os pais que querem o melhor para os seus filhos precisam apoiá-los e incentivá-los a estudar”, acrescenta Sofia com convicção.

Sofia, estudante da escola 5039 em Viana

Apesar dos desafios, Sofia tem um sonho: quer ser advogada para defender os direitos de pessoas injustiçadas. “O meu maior sonho é ser advogada, porque vejo muitas pessoas sendo tratadas injustamente, e eu quero poder ajudá-las a alcançar a justiça que merecem”, declara.

Sofia, estudante da escola 5039 em Viana

O Impacto do Abandono Escolar

A realidade, no entanto, mostra que muitas crianças não conseguem seguir o mesmo caminho de Sofia.

No município de Viana, que, antes da nova divisão administrativa de Angola, era um dos mais populosos da província de Luanda, e que contava com uma densidade populacional de cerca de 3 milhões de habitantes, a Escola nº 5102 iniciou o ano lectivo com 1.600 alunos, mas agora conta com apenas 1.181 – um abandono de quase 30%. O Director Valeriano Cassinda explica que a vulnerabilidade financeira das famílias é o principal factor.

“Muitos pais não conseguem garantir alimentação, vestuário e materiais escolares para os filhos”, lamenta.

Valeriano Cassinda director da escola

Além disso, a infraestrutura escolar precária agrava a situação. A Escola nº 5102, única primária pública da região, não tem acesso à água, comprometendo a higiene e o conforto dos alunos, especialmente das meninas. “As casas de banho não oferecem condições mínimas, e muitas meninas faltam até quatro dias por mês devido ao ciclo menstrual”, alerta Cassinda.

A professora Glória Domingos, com mais de 12 anos de experiência, afirma constatar a realidade descrita pelo Director Cassinda  diariamente . No início do ano lectivo, a sua turma tinha 70 alunos, mas agora restam 62.

“A principal causa do abandono é a fome. Muitos alunos chegam à escola sem terem comido, e alguns acabam desistindo para ajudar os pais no sustento da família”, explica.

Professora Gloria leccionando aulas

Resposta à situação

O projecto Mais e Melhor Educação chegou para apoiar o Governo na mudança dessa realidade. Financiada pelo Comité do UNICEF da Finlandia através do UNICEF Angola e implementada pela World Vision Angola Implementada através da em coordenação com a Direcção Municipal da Educação, a iniciativa combate o abandono escolar e prevê apoiar cerca de 2.500 crianças e adolescentes com foco nas meninas em situação de vulnerabilidade. 

Por meio da iniciativa a ser implementada até Outubro de 2026 em dez escolas de Viana, prevê-se identificar e abordar as causas do abandono escolar, com foco em violência e desigualdade de género, e fortalecer as medidas para reintegrar raparigas e rapazes no sistema educativo formal; prevê-se ainda reforçar o programa de Educação de Jovens e Adultos (EJA) do Ministério da Educação (MED) para oferecer oportunidades de educação não formal e formação profissional assim como  identificar e mitigar riscos de violência nas escolas e nos trajectos casa-escola, fortalecendo os mecanismos de protecção e apoio psicossocial. 

Alunos da Escola nº 5003, em Viana, beneficiários das intervenções  do projecto

Café Sebastião, coordenador da iniciativa, destaca que a intervenção vai além da educação: “Ao abordar causas como gravidez na adolescência, casamento infantil e violência de género, o projecto não só beneficia as crianças, mas também impacta positivamente as suas comunidades. Ao investir na educação e no empoderamento das meninas, contribuímos para a redução da pobreza e o fortalecimento social”. 

Para que sejam alcançados os resultados definidos pela iniciativa, as equipas de campo da World Vision têm trabalhado com os estudantes, professores, gestores de escolas e educadores de pares que são formados em saúde sexual e reprodutiva (SSR). Têm sido envolvidas familias e comunidades em actividades de sensibilização e capacitação sobre temáticas relacionadas ao abandono escolar e protecção à criança em parceria com o Ministério da Educação (MED), Ministério da Saúde (MINSA), e Ministério da Acção Social, Família e Promoção da Mulher (MASFAMU).

Alunas da escola nº 5027 em Viana, beneficiárias das intervenções do projecto

Na Escola nº 5102, o Director Cassinda reconhece a importância do projecto, mas ressalta que seria ainda mais eficaz se fosse acompanhado de apoio económico para as famílias, pois “muitos pais retiram os seus filhos da escola porque precisam de ajuda financeira. Se houvesse um suporte nesse sentido, o impacto seria ainda mais transformador”, afirma.

Com iniciativas como o Mais e Melhor Educação, espera-se que meninas como Sofia possam continuar os seus estudos e alcançar os seus sonhos, superando barreiras sociais e económicas. Porque cada criança merece a oportunidade de construir um futuro melhor.

Crianças beneficiadas pelo projecto brincando na escola