Escola de campo: a transformação para a sustentabilidade e segurança alimentar em tempos de seca
Maria Zita é uma camponesa que vive na recôndita comunidade de Nkhondo, no Sul de Angola, localizada na província do Namibe. Assim como outras mulheres da cultura Nyaneka Humbi (mumuílas), frequentou a escola somente até a 5ª classe, mas ainda assim lê e escreve muito bem.
Ela conta que uma das maiores dificuldades que enfrentou na sua infância foi a incapacidade de dar continuidade aos seus estudos. Face à ausência de escolas secundárias na localidade, e de recursos financeiros para ir para a sede do seu município, a solução foi casar-se ainda bastante jovem, seguindo uma tradição de sua etnia.
Hoje ela tem a visão de uma vida diferente para os seus filhos. Zita sonha vê-los completar os estudos e terem uma profissão e um futuro diferentes do que ela teve. Ela sonha vê-los se tornarem quadros de destaque no país.
Ainda criança, Zita enfrentava a dupla jornada de ir para a escola e depois trabalhar na lavra junto de seus pais. Após o casamento, assumiu por completo a vida de camponesa, enfrentando diversos desafios.
A seca sempre representou um inimigo para as comunidades do Sul de Angola. Maria lembra que uma das fases que os colocou em situação agravante de insegurança alimentar, foi uma época há cerca de três anos, em que as chuvas não caíram por um bom tempo, e maior parte das pessoas na sua comunidade foi obrigada a recorrer ao corte de árvores para a confecção de carvão, como sendo a única saída para que pudessem sobreviver.
Quando o projecto Okulonguesa, pelo programa de Fortalecimento da Resiliência das Famílias e Segurança Alimentar (FRESAN) chegou à comunidade, Zita viu aí uma oportunidade de mudança, e não hesitou em fazer parte. Com a implementação da Escola de Campo (ECA) nomeada Tchalomboloka em 2023, a camponesa e seu marido passaram fazer parte.
Passados os 2 anos do início das actividades, Zita tornou-se uma das coordenadoras da escola de campo. Ela ressalta que com a presença do Okulonguesa na sua comunidade, a intensidade do tempo seco não tem tido tantos efeitos como antigamente, pois graças aos ensinamentos recebidos através dos técnicos agrícolas do projecto, hoje, consegue plantar culturas resistentes à estiagem e assegurar uma boa colheita para a sua alimentação e da sua família, composta por onze membros.
“Anteriormente a perda das nossas plantações era maior. Só entendíamos que precisamos colocar a semente na terra, punhamos entre seis a cinco semente juntas, o que prejudicava o desenvolvimento do plantio. As plantas pareciam estar fracas, mas com a chegada da Escola de Campo, nossas plantações estão saudáveis, nossas maçarocas estão a brotar de forma enorme. O milho não dava bem, e a mandioca pior, realmente, nunca ganhamos conforme estamos a colher agora”, entusiasmou-se a camponesa, esclarecendo que tudo se deve aos ensinamentos da ECA.
Os avanços da Tchalomboloka são tão significativos que, actualmente, já tem capacidade para abastecer a escola local com hortícolas para a preparação da alimentação escolar dada diariamente aos mais de 120 alunos.
Alberto, esposo de Maria, é testemunha das mudanças que o projecto trouxe desde a sua implementação: “Já recebemos muita coisa, tanto em termos de capacitação como de insumos. Recebemos enxadas, catanas, sementes de plantas que antes não cultivávamos, entre outros benefícios”, afirmou.
Para eles, a ECA é já um sonho realizado, e esperam expandir esse para campos maiores, com a esperança de se tornarem uma grande cooperativa no futuro.
Apesar do projecto ter chegado ao fim, os agricultores mantêm-se confiantes. “Com a experiência que já adquirimos, vamos continuar a trabalhar e, depois, transmitir os ensinamentos aos que vierem a seguir", afirmaram.
No âmbito das suas actividades agro-pastoris, implementadas na mesma localidade, outro projecto, que visa Promover a Inclusão Socioeconómica de Mulheres através da Criação de Caprinos (PISMACC), financiado pela World Vision USA, beneficiou os agricultores da Escola de Campo com 25 caprinos, para aumentar a renda das famílias, através da criação desses animais.
O aproveitamento do leite de cabra, além de garantir a alimentação nutritiva, e o uso do couro para artesanato, vai ampliar a capacidade de sustento das famílias como a de Maria.
O projecto Okulonguesa é subvencionado pelo Camões - Instituto da Cooperação e da Língua, I.P. no âmbito do Programa FRESAN, e é implementado pela World Vision Angola em parceria com a ADESPOV, e prevê abranger até final das suas actividades mais de 20 mil pessoas através da implementação de actividades integradas.
O FRESAN é uma iniciativa do Governo de Angola financiada pela União Europeia e co-gerida pelo Camões, I. P. Pretende contribuir para a redução da fome, da pobreza e da vulnerabilidade à insegurança alimentar e nutricional no Cunene, na Huíla e no Namibe, sobretudo através do reforço da resiliência e da produção agrícola familiar sustentável, da melhoria da situação nutricional das famílias e do apoio ao desenvolvimento de capacidades nas instituições.